segunda-feira, 28 de junho de 2010

Em meu sonho

Em meu sonho...
Vi-me de repente em um sótão de lembranças, aprisionado por um lado, pelo mar de minha meninice, tão azul quanto saudoso, fazendo com que o aroma de brincadeiras de domingo, misturado a óleo de bronzeador, ofuscasse o bolor do recinto apertado e sombrio que me aprisionava.
Meus olhos não respeitaram o limite de minha improvisada jaula e viajaram até o momento em que pesquei meu primeiro peixe de tarrafa, e conseguiram por um momento rever o meu sorriso amplo e farto em meio aos amigos e pessoas caras que me deixaram pela vida.
Do outro lado eu podia ver uma quintal familiar, que muito me inspirou, e pelas noites me atraía com promessas e juras, embora nunca tivesse sido realmente meu, fui posseiro, fui errante, sonhei serenatas e proezas, tremi e chorei, e aprendi a sofrer como homem naquele iludido coração de guri.
Comecei a ouvir vozes que vinham de baixo, semelhantes a sussurros que só eram interrompidos por risadas. Minha perturbação se abrandou, quando percebi que as sombras protegiam minha presença, tornando-me um segredo imponderável, observando tudo com a discrição própria dos anjos.
O cenário era meu, mas minha presença era fluida, com um fantasma que se diverte.
Até que fui abruptamente atingindo, profundamente atingido.
Não por violência, ou por arma de fogo. Fui duramente golpeado por um olhar.
Sempre um olhar...
Aquele olhar era como nenhum outro fora até então.
Aquele olhar não só descobriu onde eu estava escondido, como também descobriu o que estava escondido em mim.
Agora o cenário era eu, e como praia fiquei a mercê do tempo e do acaso, caíram os meus muros de dentro e reconheci então as masmorras de minha insegurança.
Luciano Martini

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Exercício


Enquanto corro à noite, entre pingos e esquinas, observo ao meu redor aquilo que não me chama muito a atenção.
Talvez seja esse um exercício de abstração, da realidade inevitável, um bálsamo para dias cinzentos carregados de monotonia.
Sigo meu plano, fitando o infinito com o olhar perdido de um cão sem dono.
Mas, penso sempre na possibilidade de começar tudo de novo, com sonhos renovados, pois, sem eles, tudo fica sem graça, monótono demais pra quem aprecia o ineditismo da vida.



Luciano Martini

terça-feira, 15 de junho de 2010

Luz no inverno


Dou passos ainda incertos
em um caminho de árvores despidas
que anunciam um inverno de afetos.

Penso em recorrentes segredos
tranquilos enredos
onde sombras encobrem bolhas de sabão.

Mas, hoje
há no sol um teimoso brilhar
Abrindo a porta de um mundo insondável
De um olhar que derrama estrelas...



Luciano Martini

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Dias e Noites


todos os dias
imagino sonhos de papel
e naufrágo num mar de impressões
todas as noites
luto com as palavras
que percorrem um jardim de labirintos
todos os dias
saio a procura da criança
que fizeste surgir dentro de mim
todas as noites
viajo à mais alta das torres
lamentando o que não vivi
todos os dias
sinto a ausência
sorvendo a esperança
como um abraço que faltou
todas as noites
ensaio uma dança
que ainda não estreou
no palco da vida

todas os dias
procuro por mim
todas noites
dependo de ti




Luciano Martini